Valmir e o registro invulgar do então vulgar

janeiro 18, 2016


Conheci o Valmir por lê-lo reclamar a autoria da foto acima, publicada em uma rede social por alguém de outro país. Pouco antes me indagava a origem, se de publicidade ou algum filme, pois pelas roupas era de algo entre vinte e trinta anos atrás, quando motoneta não atraía o quê e quem atrai hoje. Pedi a ele a chance de publicá-la no Motonetas e Afins. Ele topou e trouxe também a atmosfera emocional que legitima este e mais alguns cliques seus.

Nascido em 1958, fez questão de contextualizar a era de glória da motoneta que viu com seus olhos na década seguinte. Abriu o assunto descrevendo a deliciosa imagem abaixo.

"A edição n° 455 de 7 de janeiro de 1961 da revista Manchete saudava o inicio do novo ano e trazia uma matéria focalizando as “maravilhas modernas” que eram o sonho de consumo de todos. Os seis itens mais desejados da época eram: aparelho de ar condicionado, rádio portátil, “LAMBRETTA”, TV, viagem aérea e geladeira."








No ano seguinte o sonho de consumo de duas rodas subiu um degrau, com a chegada ao país da série II da Lambretta. Nessa época, o então garotinho viu o vizinho chegar para o almoço numa Li zero quilômetro e ganhou dele a sua primeira volta na garupa de uma motoneta. Daí em diante foi decorando cada parte do modelo nas ruas, na revenda ou mesmo dos professores na escola. Acendeu-se nesse menino uma chama que em muitos foi substituída por uma infinidade de outras coisas, mas nele a fidelidade perduraria como um feliz casamento.


As décadas de '80 e '90 foram o fundo do poço em prestígio para as clássicas, realidade muito bem ilustrada pelo Valmir ao afirmar que "uma bicicleta nova custava mais caro que uma velha Lambretta". Não é incomum que as fotos da época dourada exibam um pai de família garboso posando em sua máquina de duas rodas recém adquirida, mas as da era da decadência são raras. Numa existência unicamente justificada pela utilidade prática - mera ferramenta gasta que ainda prestava em sua finalidade - não atraía para si a objetiva das câmeras.


Em 1987 Valmir comprou uma PX200, pois restauração de Lambretta não soava uma boa ideia. Modelo da Motovespa do Brasil que, pela força das vendas, não permitiu a quase extinção da categoria no Brasil. Das quais ele captou um período interessante, de Vespa combinando com emancipação feminina; nada de homens ao guidão! Do garimpo em publicações aos cliques do mouse, mais vinte anos  foram necessários para que a redescoberta das motonetas clássicas o convencessem a finalmente trazer uma Li restaurada para a garagem.



Valmir fez seus registros de um olhar do alto, como se flutuasse orbitando o sonho. Devotando um respeito incomum ao tema naquele momento, uma emoção gravada num outro tempo, com o sabor doce de desejo de infância. Por sorte a sua paixão o motivou a enxergar no vulgar o valor dessas imagens que preenchem uma lacuna da história scooterista no Brasil.

[Imagens: (1 e 3-6) Valmir Claudino dos Santos; (2) Revista Manchete]

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